Publicado Por: Redação

“No começo do ano, eu não tinha uma mesa para colocar o meu caderno. Todas as salas possuem um espaço para cadeirante, marcado com adesivo, mas não tinha uma mesa adaptada. E às vezes tinha até uma mesa comum no espaço reservado”. O depoimento é de Maria Clara Figueira, 18, estudante de psicologia em uma universidade do Recife. Maria Clara, que tem uma distrofia neuromuscular e se locomove em uma cadeira de rodas motorizada, relata que, apesar da boa relação com a faculdade, sente que precisa reivindicar os seus direitos constantemente para que a instituição se torne mais acessível. “Já senti muitas vezes que se eu não estivesse atenta, a faculdade também não estaria. E isso não é legal. Mas quando eu reivindico os meus direitos, nada me é negado. Eu tenho muito privilégio em ser ouvida, outras faculdades não fazem isso”, contou.

Para Daniel Aley, 18, estudante de Direito, ser visto como uma pessoa com deficiência já é um desafio por si só. “Por o autismo ser uma deficiência invisível, muitas pessoas nem sabem que eu sou PCD. Além disso, ou acham que nós somos como uma pessoa sem deficiência, ou que somos incapazes de fazer qualquer coisa sozinho”, relatou. Já para Miguel Souza, que também está no espectro autista, a dificuldade maior é na realização dos trabalhos e no cumprimento de prazos. “Meu maior desafio é a disfunção executiva, a dificuldade de iniciar, planejar e se manter em tarefas. Por isso, eu acabo atrasando os trabalhos e preciso pedir um prazo extra”, relata o estudante.

“Acessibilidade é um direito, não um favor, mas muitas universidades não enxergam dessa forma”, afirma Ana Clara Moniz, pessoa com deficiência, estudante de jornalismo e ativista anti-capacitista, que usa seu espaço nas redes sociais para militar em prol dos direitos garantidos por lei para a comunidade PCD. Ana Clara explica que muitas universidades não estão preparadas para receber pessoas com deficiência, e que isso tende a piorar.

Com a recente Política Nacional de Educação Especial, implementada pelo Governo Federal, que incentiva a criação de classes e escolas exclusivas para crianças com deficiência, Moniz teme que os jovens com deficiência sejam ainda mais segregados pela falta de contato com

pessoas diferentes, e que as universidades se tornem ainda mais despreparadas e restritas e não acolham os estudantes da mesma forma que eles eram acolhidos nas escolas especiais. “Quando a pessoa com deficiência chega na faculdade e não existe mais esse tratamento especial, é um choque até para pessoas sem deficiência, e as chances de capacitismo são maiores. As escolas especiais segregam. E segregar não é inclusão, não é por isso que a gente luta”, contou.

Segundo o promotor de justiça e especialista em Direitos Humanos Max Vignoli, é papel do Estado assegurar a inclusão das pessoas com deficiência na sociedade desde cedo, começando pela educação básica, até o mercado de trabalho. “É preciso que o Estado promova a educação inclusiva, para que as pessoas com deficiência possam conviver com as sem deficiência e possam ser inseridas na sociedade sem qualquer distinção”, afirmou.

No Brasil, os direitos das pessoas com deficiência são garantidos por lei, de acordo com o estatuto da pessoa com deficiência e a convenção internacional da pessoa com deficiência. Entretanto, para Vignoli, pela falta de divulgação e pela falta da implementação desses direitos na prática, muitas pessoas com deficiência os desconhecem, e se tornam reféns de injustiças. “A previsão dos direitos da pessoa com deficiência já existe no ordenamento jurídico. A dificuldade é a implementação e a divulgação desses direitos na prática, para que as pessoas com deficiência possam acessa-los", analisou.

 

Reportagem especial produzida pelos alunos da disciplina de Jornalismo e Direitos Humanos da Universidade Católica de Pernambuco.

¿ Clara Nilo: @claranilo

¿ Guilherme Anjos: @guigsanjos

¿ Vitória Floro: @vtrro

 

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