Ex-aluno de Jornalismo publica livro sobre história das relações de gênero na imprensa recifense - Unicap

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Ex-aluno de Jornalismo publica livro sobre história das relações de gênero na imprensa recifense

Publicado Por: André Amorim

Em meio às críticas em torno ao que os conservadores e fundamentalistas tratam erroneamente como “ideologia” de gênero, o ex-aluno do curso de Jornalismo e ex-estagiário da Assessoria de Comunicação da Unicap, Tércio Amaral, lança o livro “Suplementos literários, imagens e a imprensa recifense em fins da década de 1920”, pela Editora Appris (2020). O livro é resultado da dissertação de mestrado em História da Cultura Regional, defendida na Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), no ano de 2016, e orientada pela professora Alcileide Cabral do Nascimento. O trabalho que analisa as relações de gênero a partir dos suplementos literários de dois jornais impressos no Recife – o Diario de Pernambuco e o Diario da Manhã – é resultado de uma pesquisa, iniciada no ano de 2008, no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic) da Católica no curso de Jornalismo.

O livro historiciza os suplementos literários, que eram cadernos e/ou páginas de literatura produzidos e editados pela imprensa recifense, muito comum nos jornais brasileiros sobretudo até as décadas de 1960 e 1970. Nesses suplementos, por exemplo, nomes como o antropólogo Câmara Cascudo, os sociólogos Gilberto Freyre e Josué de Castro, tiveram suas produções publicadas na imprensa. “Esses suplementos iniciaram o que chamamos hoje de jornalismo cultural. Eles vão acompanhar, por exemplo, a inserção do cinema como produto cultural, o auge do rádio no país e até o começo da produção televisiva nos anos 1950”,  comenta Tércio Amaral. A escolha pelos anos 1920 é atribuída ao fato da aparente modernização que o país e o estado de Pernambuco viviam. Modernização, sobretudo de caráter urbanístico, mas que enfrentava resistência no campo da moralidade e nos costumes. “Eram comuns artigos antifeministas, que diziam que as mulheres que não votavam eram felizes, que cidadania não era sinônimo de voto”.

O livro é dividido em três capítulos. O primeiro trata das transformações na sociedade, sobretudo a brasileira e recifense na década de 1920, tendo como pano de fundo as mudanças que os jornais locais estavam empreendendo em termos gráficos e redacionais. O segundo capítulo analisa as condições de trabalho da imprensa, a exemplo da ausência de mulheres nesses jornais e o efeito causado por publicações cuja grande maioria era produzida por jornalistas homens. E, por fim, o terceiro capítulo analisa as ilustrações e fotografias publicadas nos suplementos e a representação social do masculino e do feminino. O livro é prefaciado pela professora da UFRPE, Alcileide Cabral, especialista em relações de gênero, e tem a sinopse assinada pela professora do curso de Jornalismo da Unicap, Aline Grego, que atua na área de história da imprensa. A orelha é assinada pela historiadora Juliana Ramos.

O recorte do Diario de Pernambuco compreende os anos de 1924 e 1925, época em que a empresa era gerida pela família Lyra, representada pela figura do usineiro Carlos Lyra Filho, que encarregou o sociólogo Gilberto Freyre editar seu primeiro grande trabalho na imprensa: o Livro do Nordeste, em 1925. O livro era de caráter comemorativo em alusão ao primeiro centenário do hoje jornal mais antigo em circulação na América Latina. Já no Diario da Manhã o recorte abrange os anos de 1927 e 1928. Este jornal era de propriedade da família Cavancalti de Lima, que exerceu forte influência política no estado a partir dos anos 1930, com a ascensão do interventor e governador Carlos de Lima Cavalcanti. “Eram dois jornais conservadores, mas de fato o Diario da Manhã chamava a atenção com as ilustrações do então jovem Lula Cardoso Ayres, que desenhava mulheres com os seios aparentes, que dava movimento ao corpo feminino. Ou seja, havia um pensamento conservador com algum tipo de ‘resistência’”.

Na Unicap, a pesquisa foi iniciada sob a orientação da professora Aline Grego, do curso de Jornalismo, e contou com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Na época, o objetivo do trabalho era catalogar e identificar os suplementos literários produzidos e encadernados na imprensa recifense na primeira metade do século 20. “Foi a partir desse contato com a documentação que eu percebi a maneira preconceituosa que as mulheres eram tratadas pelos jornais, mesmo em um tipo de jornalismo que a proposta inicialmente era mais leve. Mesmo em poesias, crônicas e outros artigos de cunho acadêmico (escritos por homens), elas sempre eram tratadas em um mundo à parte”, comentou o autor. A pesquisa visava contribuir com as pesquisas da História do Jornalismo no Brasil pela Rede Alfredo de Carvalho, grupo que reúne pesquisadores na área da História da Imprensa em todo o país.

O trabalho, mesmo sendo iniciado no curso de Jornalismo, sempre foi voltado à História da Imprensa, área ainda carente de estudos em Pernambuco. Além de Jornalismo pela Católica, Tércio Amaral também tinha graduação em História pela Universidade de Pernambuco (UPE). O projeto, além de resultar no livro, também foi premiado na Jornada de Iniciação Científica da Católica como melhor pesquisa na Área de Ciências Sociais Aplicadas, no ano de 2009. “No curso de História, sempre participei de grupos de estudos, mas nunca tive uma pesquisa ‘engatilhada’. Curiosamente, comecei a pesquisar em História num curso de Jornalismo, o da Unicap. E essa relação me ajudou muito na escrita da história e de como eu me comunico com o eleitor de história”.  

A pesquisa continuou no Doutorado em História da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde Tércio estuda a obra do jornalista e poeta Mauro Mota desde o ano de 2017. “Inicialmente, eu iria analisar exclusivamente o suplemento que ele editou no Diario de Pernambuco entre nos anos 1940 e 1950. Mas a pesquisa cresceu e agora, além do suplemento, analiso a obra intelectual deixada por ele”, comenta o jornalista e historiador. “O que chama a atenção é que, mesmo sendo um suplemento publicado praticamente 20, 30 anos depois, a abordagem em relação à mulher continua a mesma. Até hoje comento com as duas orientadoras os achados dessa documentação, apesar do estudo não está sendo dedicado exclusivamente às relações de gênero. Este livro também provoca as relações da imprensa hoje: como estão sendo abordadas as mulheres e qual a representação masculina na economia, na política? É uma desigualdade que persiste, em um novo formato, em pleno século 21”.

Sobre o autor – Como jornalista, Tércio Amaral trabalhou por sete anos no Diario de Pernambuco, sendo cinco deles dedicados ao caderno de Política. Foi coordenador de Jornalismo do Ministério da Educação (MEC), em Brasília, entre os anos de 2017 e 2019, das gestões dos ministros Mendonça Filho a Ricardo Vélez Rodríguez.

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