Enfrentamento ao racismo reúne colaboradores das obras jesuítas no Brasil - Unicap
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Enfrentamento ao racismo reúne colaboradores das obras jesuítas no Brasil
As questões do enfrentamento ao racismo no país e seus desafios foram tema de discussão do Encontro Afro Brasil SJ. A ação foi promovida pela Província dos Jesuítas do Brasil em São Paulo e reuniu colaboradores das obras da Companhia de Jesus. A Unicap foi representada pela Pró-reitora de Pesquisa, Pós-graduação e Inovação, Valdenice José Raimundo; e pelo coordenador do Núcleo Unicap de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas (Neabi), Padre Clóvis Cabral, que é jesuíta.
O objetivo central do encontro que aconteceu entre os últimos dias 1º e 3 de outubro foi o de traçar linhas de ação e planejamento para 2022. Durante a programação, Padre Clóvis falou sobre os novos desafios para as questões étnico-raciais no Brasil de hoje. “Abordei a questão étnico-racial do ponto de vista do movimento negro brasileiro contemporâneo em face ao recrudescimento das manifestações de preconceito racial contra pessoas negras e da divulgação de dados sobre a situação de desigualdade racial, que se abate sobre mais da metade da população brasileira. Insisti na afirmação que toda essa situação encontra suas raízes na persistente permanência do racismo que, no caso do Brasil, é estrutural, institucional e sistêmico”. A integra da fala dele está disponível ao final da matéria.
A professora Valdenice explicou que a articulação girou em torno de discussões sobre o que as obras podem fazer para enfrentar o racismo. “Ouvimos um ao outro para construir juntos diretrizes, estratégias de como fortalecer essa questão nas obras em que já existem e como provocar a criação desse o debate, de grupos, de ações em instituições que ainda não têm”, destacou ela que já coordenou o Neabi da Unicap.
"A gente teve a oportunidade de partilhar a nossa experiência, foi um momento de troca riquíssima e cada um pode contribuir com o fortalecimento do outro”, frisou.
Consciência Negra – O debate em torno do enfrentamento ao racismo vai contar ainda com uma programação especial na Unicap durante a Semana da Consciência Negra. O evento vai acontecer entre os próximos dias 1º e 5 de novembro (menos no feriado do dia 2), de forma remota, mas com transmissão pelo youtube.com/unicapvideo. Os detalhes da programação serão divulgados em breve.
Confira abaixo a fala, na íntegra, a de Padre Clóvis Cabral SJ
A Sociedade brasileira começa a reagir
Há uma "tomada de consciência" de que a "questão racial" no Brasil tem uma urgência! Esse "sentido de urgência” vem sendo posto para o debate na sociedade brasileira, por algumas pessoas, notadamente intelectuais vinculados/as ou não ao "mundo acadêmico” (Universidades) e Centros de Pesquisa, sendo alguns destes vinculados a administração estatal (IBGE, Ministério da Cultura, Fundação Cultural Palmares).
Este “sentido de urgência” também tem sido proposto por uma gama variada de instituições e/ou organizações: Partidos Políticos (aqueles situados no “campo progressista”), Organizações religiosas (CNBB,CBJP,CONIC,CPT,CIMI,Pastorais de combate ao racismo em diversas Igrejas Cristãs,etc.) Organismos vinculados a ONU (UNESCO, UNICEF, ONU Mulheres); CEPAL, Banco Mundial. Esse "sentido de urgência” tem sido trazido para o "debate público”, contemporâneo a nós, principalmente pelo Movimento Negro Brasileiro, notadamente desde o final da década de 1970 do século passado.
As raízes históricas
Insisti que a escravidão não foi um simples episódio na história do Brasil; foi antes um evento que perdurou entre nós por mais de trezentos anos. O Brasil foi o maior importador das Américas de africanas e africanos sequestrados em seu continente ancestral e aqui, transformados em coisas, objetos (“peças”); estima-se que aqui no Brasil, tenha chegado 40% do total de africanas e africanos escravizados durante toda a empreitada colonialista. O PASSADO VEM COMO “ASSOBRAÇÃO” AO PRESENTE.
De um modo sintético insisti que podemos afirmar que as realidades nomeadas “heranças da escravidão”, aparece contemporaneamente sob três faces. A primeira delas é a “desigualdade” (Somos o 9º país mais desigual do mundo. São desigualdades regionais, entre homens e mulheres, entre negros e brancos...). A segunda é a “violência institucionalizada” (Violência sistêmica e estrutural, utilizada como instrumento punitivo para controle dos corpos e das populações empobrecidas, notadamente quando estas se “rebelam”.
Violência que explode através da “necropolítica”) A terceira é a baixíssima ou quase nenhuma “representação” de homens negros e mulheres negras nos espaços de poder e decisão. Violência simbólica, tão mortal quanto a violência física. Esses espaços não são democráticos - mesmo no sentido liberal-republicano do conceito - como apregoam, permanecem fechados hermeticamente para pessoas negras.
Uma das principais facetas da desigualdade racial no Brasil é a forte concentração de homicídios na população negra. Quando calculadas dentro de grupos populacionais de negros (pretos e pardos) e não negros (brancos, amarelos e indígenas), as taxas de homicídio revelam a magnitude da desigualdade. É como se, em relação à violência letal, negros e não negros vivessem em países completamente distintos.
A pirâmide social brasileira é gradiente em preto e branco: quanto mais próximo do alto, mais branco; quanto mais próximo da base, mais preto. A desigualdade social e a pobreza no Brasil têm a “cara preta”.
Uma Reflexão Teológico-Pastoral
Iniciei recuperando o conceito bíblico-teológico de “Sinais dos Tempos”. Olhar, ver, debruçarmo-nos sobre essa realidade diabolicamente pecaminosa do racismo estrutural brasileiro (que é institucional, sistêmico e estrutural), percebendo esse tempo presente que nos toca viver, como “um momento de graça”. Deus nos interpela e questiona a partir dos rostos dessas pessoas, postas à margem, descartadas (Papa Francisco) pelo sistema capitalista selvagem. Deus nos interpela e questiona e pede conversão. Conversão pessoal e conversão estrutural.
Essa conversão exige Reparação Já, assim como apresentada na Terceira Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância promovida pela ONU no ano de 2001.
Conclusão da Fala
O “Outro Mundo Possível” com o qual sonhamos e pelo qual lutamos, começa a ser construído aqui e agora. Recordo uma frase de Jean Paul Sartre, que tem a ver com o que eu gostaria de dizer agora na conclusão deste texto: “O mais importante de tudo, não é aquilo que fizeram de nós, mas, o que nós vamos fazer, com aquilo que fizeram de nós”.
As novas relações (étnico-raciais) que desejamos entre todas as pessoas “independentemente” da cor de sua pele ou da textura de seu cabelo, precisam para se concretizarem, da nossa “Ação”, do “Magis”, da nossa entrega apaixonada à causa do Reino.
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